Computer Science and Engineering

p-ISSN: 2163-1484    e-ISSN: 2163-1492

July, 2012;

doi: 10.5923/j.computer.20120001.02

Planeamento do Território e TIC: Tendências, Mudanças e Desafios

Miguel Branco-Teixeira 1, Isabel Breda-Vázquez 2

1Faculdade de Ciência e Tecnologia Universidade Fernando Pessoa Porto, Portugal

2Secção de Planeamento do Território e Ambiente Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto Porto, Portugal

Correspondence to: Miguel Branco-Teixeira , Faculdade de Ciência e Tecnologia Universidade Fernando Pessoa Porto, Portugal.

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Abstract

Resumo Atendendo às novas realidades territoriais resultantes do desenvolvimento da sociedade em rede, o artigo analisa as relações entre as Tecnologias de Informação e Comunicação (TIC) e o planeamento do território. Procura-se, essencialmente, compreender o impacto das TIC no planeamento do território, quer enquanto instrumento de trabalho dos profissionais de planeamento, quer enquanto veículo de comunicação com a população e com organismos públicos e privados. O artigo conclui identificando as principais tendências, mudanças e desafios que a utilização generalizada das TIC coloca na disciplina do planeamento do território.

Keywords: Palavras Chave, Planeamento, TerritÓRio, TIC, Participação

1. Introducão: O papel das TIC no Planeamento do Território

Na sociedade actual, assiste-se ao aumento generalizado do grau de exigência relativamente às performances do planeamento do território. Em termos genéricos, requer-se a melhoria da qualidade e da eficiência (diminuição do tempo e dos custos dos processos) a todos os níveis de actividade, desde os serviços administrativos prestados pelas câmaras municipais, até à elaboração das propostas de intervenção apresentadas nos diferentes planos.
Num estudo realizado para o Governo Britânico com o objectivo de melhorar o desempenho do planeamento do território é sublinhado que as TIC possuem características muito interessantes para alcançar esse desiderato[1]. É salientado, particularmente, que a utilização das TIC possibilita melhorar a acessibilidade e qualidade dos serviços públicos e reduzir o seu custo, bem como ajuda a revitalizar as relações entre os cidadãos, as empresas e as entidades públicas. Deste modo, o estudo divide o uso das TIC no planeamento entre dois campos; o primeiro associado a critérios de “management” e o segundo associado a critérios de comunicação e participação.
Evans-Cowley e Hollander[2] consideram que a utilização das TIC cria novas oportunidades, sobretudo para o planeamento local, podendo designadamente contribuir para a sua reestruturação, alterando rotinas e estratégias que se encontram estabelecidas e ultrapassadas desde há muito.Estes autores referem-se, concretamente, à falta de vontade para inovar os métodos e os procedimentos de trabalho e às resistências dos técnicos de planeamento, principalmente os mais antigos, quer para disponibilizar informação, quer para facilitar a interação com a população.
Neste sentido, Raut[3] considera que as TIC são protagonistas de mudanças intensas, que possibilitam uma evolução significativa no planeamento territorial, tanto no que respeita aos processos e à técnica, como ao seu próprio enquadramento disciplinar. O autor refere-separticularmente às mudanças ligadas à participação da população, a qual, devido à maior disponibilidade informativa dos cidadãos, se torna mais intensa e exigente, e à coordenação interdepartamental, a qual se reforça significativamente, dada a facilidade de relacionamento entre os diferentes intervenientes.
Debruçando-se sobre as características das TIC, Larsen[4] destaca as mais-valias que representam para a atividade do planeamento do território, nomeadamente devido às melhorias que promovem ao nível da informação e da comunicação. Assim, no que se refere à informação, salienta a possibilidade dos cidadãos receberem de forma célere, económica e ajustada, notícias relativas aos assuntos de âmbito local. No que se relaciona com a comunicação, Larsen[4] realça o estabelecimento de conexões,independentemente do tempo e do lugar, a diferentes instituições e grupos sociais.
Com efeito, o uso de ferramentas TIC, tais como os Sistemas de Informação Geográfica (SIG), os bancos de dados, o correio eletrónico ou os sistemas comunicativos (chats, blogues, etc.), possuem um enorme potencial para melhorar a qualidade e eficiência das atividadesdesenvolvidas, nomeadamente a nível local[2][5]. Perante as faculdades evidenciadas pelas TIC, as organizações e os processos de trabalho associados aos profissionais de planeamento têm de mudar, com o objectivo de se adaptarem e de integrarem da melhor forma possível as novas tecnologias[6].
No entanto, a passagem do planeamento do mundo analógico para o mundo digital não é fácil. Existem hábitos enraizados no “paradigma do papel” do mundo analógico que, ao serem substituídos por “bits” dentro dos computadores do mundo digital, provocam necessariamente algumas resistências e conflitos.
Ainda que seja muito difícil prever as repercussões da revolução tecnológica em curso, o certo é que o planeamento já recorre a muitas tecnologias informáticas (SIG, sistemas de controlo de tráfego, programas para a elaboração de planos, etc.). De facto, na prática, observa-se que oplaneamento começou já a apropriar-se das novas tecnologias a diferentes níveis, procurando reposicionar-sedisciplinarmente de forma a melhorar o seu desempenho[7][8]. Esta apropriação torna-se, aliás, fundamental, ao possuírem as TIC um amplo e diversificado leque de aplicações no planeamento do território. Com efeito, elas são utilizadas com objectivos e de modos significativamente distintos nas diferentes etapas que compõem o processo de planeamento.
Interessa, pois, investigar pormenorizadamente as várias possibilidades e resultados da utilização das TIC no planeamento do território, em especial no âmbito local. Entre outras, pode estabelecer-se uma primeira grandecompartimentação em torno da utilização das TIC no planeamento tendo em consideração duas vertentes: enquanto instrumento de trabalho e enquanto veículo de comunicação.
Assim sendo, como instrumento de trabalho as TIC podem ser essencialmente utilizadas no apoio às funções dos profissionais de planeamento no decorrer dos processos de planeamento; como veículo de comunicação podem ser fundamentalmente utilizadas na comunicação com a população e com organismos públicos e privados, isto é, no processo de participação pública.
É pois, segundo estas duas vertentes, necessariamente interligadas, que irão ser seguidamente analisadas as repercussões da utilização das TIC no planeamento do território.

2. As TIC Como Instrumento de Trabalho no Planeamento do TerritÓRio

Como é evidente, na actividade do planeamento do território, como em qualquer outra actividade, quando se tem à disposição melhores instrumentos de trabalho, consegue-se aumentar a qualidade dos resultados produzidos. No que respeita às TIC, existe um grande consenso na comunidade científica internacional sobre os benefícios da sua utilização enquanto instrumento de trabalho dos profissionais de planeamento[1][5][9][10]. Em particular, as TIC são hoje imprescindíveis na obtenção e processamento de informação a nível local, o que contribui para que o planeamento seja mais transparente e se minimizem as possibilidades de corrupção. Para James et al[1] as TIC possibilitam diagnósticos e previsões mais credíveis, permitindo um rápido acesso às informações e às decisões relativas ao planeamento potencia novos atrativos para o investimento.
De facto, desde o software mais simples paraprocessamento de texto utilizado nos computadores, passando obrigatoriamente pelos SIG e pelo CAD, até chegar à modelação ou à realidade virtual, muitas são as aplicações possíveis das TIC no planeamento.
Em termos concretos, enquanto instrumento de trabalho no planeamento do território, as TIC podem desempenhar funções a vários níveis, sendo de salientar as seguintes: Recolha e análise de informação, Cenários e Simulações, Produção de documentos e Avaliação e Monitorização.

2.1. Recolha e AnÁLise de Informação

A recolha, tratamento e análise de informação registaram com o emprego das TIC melhorias quantitativas e qualitativas muito significativas, reduzindo-se, em simultâneo e consideravelmente, o tempo de obtenção dessa informação[1]. Neste particular, a Internet constitui uma fonte de informações para o planeamento praticamente inesgotável. Também as Intranets possibilitam um novo contexto de colaboração interna entre departamentos municipais que aumenta a eficiência e transparência nos processos de planeamento.
De acordo com Nedovic-Budic[11] a geo-referenciação da informação e a construção de mapas digitais, possibilitadas pelos SIG, facilitam a análise multi-dimensional relativa à cada vez maior e mais complexa informação de suporte do planeamento. Nomeadamente, as imagens de satélite e as fotografias aéreas são usadas para gerar informação relativa a: mapas físicos e geo-morfológicos, cadastro, demografia e habitação, recursos físicos (solo, água, minerais, fauna e flora), áreas ambientais sensíveis, zonas degradadas e clandestinas, áreas congestionadas, fluxos de tráfego, etc. Deste modo, muitas informações sobre o quotidiano urbano (trânsito, poluição, etc.) chegam praticamente em tempo real aos municípios, possibilitando uma resposta imediata dos técnicos.
Assim sendo, as TIC contribuem para uma maior eficiência nas análises (tempo, custo e fiabilidade), facilitando posteriormente uma preparação mais cuidada dos planos. No tratamento de informação pode, ainda, recorrer-se ao desenvolvimento de modelos que permitam cruzar informações e aferir diferentes alternativas.
Com efeito, como refere Raut[3], as TIC permitem que não só a quantidade de informação de base disponível para os técnicos de planeamento esteja a aumentar muito rapidamente, como também que os instrumentos para a analisar estejam mais acessíveis e fáceis de usar do que nunca.
Ou seja, as TIC garantem mais e melhor informação e permitem análises mais aprofundadas, pelo que, como argumentam James et al[1], os planeadores necessitam delas para elaborarem diagnósticos territoriais mais precisos e fidedignos, e, consequentemente, conceberem e implementarem medidas mais eficientes.

2.2. Cenários e Simulações

A geração de diferentes alternativas e a compreensão dos seus impactos representam uma grande mais-valia para os técnicos de planeamento, em especial no momento em que se tomam as decisões.
As TIC possibilitam a criação de vários cenários e simulações sobre as questões de planeamento, bem como proporcionam os meios para se estudarem as suas consequências. Sobretudo através de métodos matemáticos (extrapolação, projecção, etc.) e integrando variáveis conhecidas e “expectáveis” é possível prospectivar os resultados. Entre muitas outras, são frequentes as simulações de tendências territoriais ao nível da população, da habitação ou do tráfego, recorrendo aos SIG[12].
De igual modo, a produção de modelos dinâmicos sobre a realidade territorial, actualizados em tempo real, tem grande utilidade na percepção do funcionamento quotidiano das cidades.
Saliente-se, particularmente, o facto dos modelos de cálculo, as simulações e os cenários contribuírem para melhorar a informação dos técnicos de planeamento, simplificando e credibilizando os seus estudos relativos à implementação de diferentes alternativas territoriais[5].

2.3. Produção de Documentos

Na preparação e apresentação de cartas, relatórios, planos, etc. as TIC contribuem para uma profunda alteração destas tarefas. Como descreve Branco-Teixeira[7], as TIC permitem facilmente produzir informação sobre o uso do solo, o zonamento, a demografia, o ambiente urbano, a localização da habitação, as infra-estruturas urbanas (água, saneamento, energia elétrica), etc. que posteriormente se integra nos diferentes documentos.
Na actualidade, praticamente todos os mapas, desenhos, quadros, gráficos, tabelas, etc., são gerados e apresentados recorrendo a elas. Assim sendo, como afirma Nedovic-Budic[11], a aplicação das TIC não só aumenta a qualidade do trabalho, como acelera a elaboração do mesmo.

2.4. Avaliação e Monitorização

De acordo com Branco-Teixeira[7], as TIC são utilizadas para acompanhar a implementação e monitorizar as acções e medidas resultantes do processo de planeamento. Com efeito, recorrendo à geo-referenciação e depois de estabelecido um conjunto de indicadores de monitorização torna-se mais fácil acompanhar a sua evolução, identificando e corrigindo os desvios e os problemas que possam surgir[11]. Neste sentido, Raut[3] salienta que quanto mais interactivo for o sistema implementado maior será o rigor da monitorização e da avaliação. Existem modelos computacionais que foram desenvolvidos para o Planning Support System (PSS) e para o Decision Support System (DSS), tais como o “What if?” - basicamente um modelo de avaliação de acções de planeamento - ou o “Community Viz” - essencialmente um modelo de visualização - que facilitam a configuração e compreensão de cenários territoriais[5].
No planeamento territorial, existem muitas actividades em que é imperativa a monitorização permanente do seu desempenho, logo é inevitável o uso das TIC, como sejam, por exemplo, os casos do ambiente, do trânsito, ou da segurança.
Pode pois constatar-se que, devido ao papel das TIC ao nível da recolha e análise de informação, da criação de cenários e simulações, da produção de documentos e da avaliação e monitorização, elas são essenciais enquanto instrumento de trabalho, estando os profissionais de planeamento cada vez mais dependentes da sua utilização[8].
Refira-se igualmente que a generalização das TIC pode trazer impactos negativos ao planeamento, em consequência da maior standardização e uniformização e de alguma limitação da criatividade no acto de planear.
Assim sendo, podem identificar-se um conjunto de obstáculos à expansão da utilização das TIC como instrumento de trabalho dos profissionais de planeamento:
• Problemas de acesso às TIC, devido sobretudo ao preço e à compatibilização de sistemas informáticos;
• Complexidade da selecção e gestão da informação;
• Dependência de empresas de software e hardware;
• Inexistência de enquadramento legal das TIC na actividade de planeamento;
• Dificuldades de harmonização de informação entre diferentes organismos;
• Défice de conhecimento sobre as TIC;
• Falta de técnicos qualificados nos municípios;
• Pouca motivação dos planeadores pela escassa importância atribuída à utilização das TIC no planeamento por parte de quem decide.
Como destacam James et al[1], verifica-se uma enorme dificuldade em produzir boa informação, facto que constitui um grande problema para o desenvolvimento das TIC, nomeadamente dos SIG. Em particular, salientam que, para além do pouco conhecimento dos planeadores sobre as TIC, o mercado no que respeita a software especificamente direccionado para a actividade de planeamento é relativamente pequeno, o que dificulta uma maior integração das TIC mais sofisticadas no planeamento.
Por seu lado, Sikiaridi e Vogelaar[13] chamam a atenção para o facto das TIC apresentarem limitações como instrumento de prospectiva, devendo assim os técnicos de planeamento ter o discernimento suficiente para não considerar os resultados provenientes da sua operacionalização como absolutos, integrando-os em análises mais amplas.
Em suma, as TIC possuem um conjunto de características que permitem considerá-las como um instrumento de trabalho indispensável no planeamento do território, no entanto existem igualmente algumas questões que podem comprometer o seu desempenho, nomeadamente associadas às acessibilidades e ao modo como os técnicos de planeamento as compreendem e utilizam.

3. As TIC Como VeÍCulo de Comunicação do Planeamento do TerritÓRio

Até há bem pouco tempo, os processos de planeamento eram, como refere Ryser[14], desenvolvidos praticamente sem que as comunidades locais tivessem grande oportunidade de participar. Para proceder desta forma, segundo a autora, o sector público justificava-se afirmando que a informação era confidencial, enquanto o sector privado invocava segredos comercias para não divulgar qualquer informação.
Esta realidade alterou-se significativamente, e com a implementação das TIC em particular ao nível do poder local, é possível obter informação e acompanhar a evolução de determinada situação, em casa, através da Internet, ou em terminais públicos ligados aos departamentos de planeamento. Do ponto de vista tecnológico, a comunicação tornou-se mais fácil e acessível, devido sobretudo à diminuição do custo e ao aumento da velocidade de processamento, o que se reflectiu positivamente, no relacionamento entre os cidadãos e os departamentos de planeamento[14].
O emprego das TIC em diferentes fases do processo de planeamento pode representar uma importante mais-valia para incrementar o interesse dos cidadãos, levando-os a participarem mais activamente na construção e gestão do território. A intensificação dos diálogos e dos debates (muitos dos quais materializados graças às TIC) em torno das temáticas do planeamento são uma consequência lógica do aumento desse interesse.
Com efeito, segundo Sikiaridi e Vogelaar[13], as TIC potenciam a exteriorização do processo de planeamento permitindo um maior envolvimento dos cidadãos, a maioria dos quais tem grandes dificuldades em compreender o que está em causa nas questões territoriais. Desta forma, as TIC podem contribuir consideravelmente para uma maior aceitação pela população das decisões tomadas no âmbito do planeamento do território.
As melhorias na comunicação resultantes da utilização das TIC provocam igualmente efeitos muito interessantes ao nível do aprofundamento da colaboração entre diferentes organismos ou departamentos, que, como refere Raut[3], se traduzem num planeamento e gestão do território mais sustentáveis. Para Raut[3], a cooperação interdepartamental é fundamental, e as TIC, em particular a Internet, oferecem um domínio em que todos podem participar, possibilitando ultrapassar muitas das barreiras tradicionalmente existentes entre os diversos serviços.
Em termos concretos, enquanto veículo de comunicação do planeamento do território, as TIC podem desempenhar funções a vários níveis, sendo de destacar as seguintes: Divulgação de informação, Visualização, Comunicação e Participação.

3.1. Divulgação de Informação

As TIC são um excelente meio para divulgar a informação relativa ao planeamento do território, beneficiando os cidadãos da rapidez e da acessibilidade “24/7” à informação produzida. Ultrapassando os condicionantes de ordem física e temporal, as TIC, sobretudo a Internet, permitem que os municípios facultem uma gama enorme de informação à população. Deste modo, é reforçada a transparência do processo de planeamento e promovido, entre a população, um maior conhecimento sobre as actividades de planeamento[13].
As TIC, ao aumentarem o nível de informação da população sobre as actividades de planeamento, contribuem para vencer muitas resistências e conflitos, alargando a base social de apoio dos processos decisórios.
Simultaneamente, durante os períodos de elaboração de documentos específicos do planeamento territorial (relatórios, projectos, planos, etc.), as câmaras municipais podem disponibilizar facilmente à população, através, por exemplo, das suas páginas electrónicas na Internet, os “drafts” produzidos, podendo a versão final desses documentos tirar partido dos conhecimentos dos cidadãos[3].
No entanto, à medida que aumenta a facilidade de acesso e o volume do conteúdo de informação é importante que se tenha particular atenção na sua disponibilização. Para além dos cuidados na qualidade dos conteúdos, deve procurar estabelecer-se a maior equidade e democraticidade possível entre o livre acesso à informação e a protecção da privacidade, a propriedade intelectual e os direitos comerciais do que é disponibilizado.

3.2. Visualização

A visualização através da utilização das TIC permite uma maior compreensão das opções de desenvolvimento, tornando possível entender melhor as repercussões das diferentes alternativas dos projectos, designadamente em termos de impacto visual, alterações físicas, etc. Como refere Al-Kodmany[12], entre os diversos instrumentos de visualização actualmente utilizados pelos técnicos de planeamento, merecem particular destaque, pela sua enorme difusão e facilidade de compreensão, os SIG, o ARTIST e a foto-manipulação por computador. Neste sentido James et al[1] sublinham o contributo dos actuais modelos de visualização a três dimensões nos processos de planeamento, sendo de esperar que, em breve, com a generalização dos modelos a quatro dimensões (incluindo a evolução ao longo do tempo) sejam alcançados ainda melhores resultados. Refira-se, no entanto, que a combinação de diferentes técnicas de visualização, como as tradicionais a duas dimensões (mapas e fotografias aéreas) e de novas técnicas interactivas a três e quatro dimensões, ajuda os cidadãos a compreender e a melhor avaliar as propostas de planeamento que lhes são apresentadas[15]. Desta forma, reduz-se o ”gap” entre os especialistas nestas tecnologias e o cidadão comum, que tem frequentemente muitas dificuldades em perceber as representações virtuais do território.
A visualização fomenta um maior envolvimento dos cidadãos no processo de planeamento, pois torna a participação mais atractiva e possibilita que sejam os próprios cidadãos a desenvolver os seus projectos. Trata-se, nas palavras de Al-Kodmany[12], de desenhar e planear com as pessoas. Com efeito, uma das vantagens mais relevantes da visualização reside na construção de um relacionamento de confiança entre os técnicos de planeamento e as comunidades locais que gostam de poder observar os diferentes cenários (passado, presente e futuro) das intervenções espaciais.

3.3. Comunicação

Através dos e-mails, dos chats ou dos fóruns interactivos, as TIC facilitam o estabelecimento de contactos e a troca de experiências entre a administração pública e a população a vários níveis. O crescimento dos canais de comunicação potencia igualmente o aprofundamento dos laços e a criação de redes entre diferentes instituições.
As TIC promovem o desenvolvimento de plataformas de comunicação “one-to-one” ou “one-to-many” para tratar os assuntos relacionados com o planeamento. Deste modo, vem-se assistindo ao aumento dos espaços electrónicos especializados nas temáticas territoriais, nomeadamente com a emergência das conhecidas comunidades virtuais[12][13].

3.4. Participação

As TIC possuem um enorme potencial para aumentar o índice de participação pública. Com efeito, principalmente a Internet, a realidade virtual e os SIG, apresentam, quando comparadas com as soluções tradicionais, grandes vantagens ao possibilitarem que a participação deixe de ser condicionada por questões associadas ao tempo ou à localização geográfica[2].
De modo geral, os cidadãos vêem reduzido o tempo que despendem interagindo com as câmaras municipais, tornando-se, simultaneamente, o relacionamento mais eficiente. Uma das vantagens provenientes da utilização das TIC refere-se à redução do “tempo de espera”, ou seja o tempo que medeia entre a participação dos cidadãos e a obtenção de resultados. A diminuição do “tempo de espera”, que em muitos municípios é frequentemente demasiado longo, incentiva os cidadãos a envolverem-se mais activamente nos processos de planeamento do território, o que constitui um importante facto para a governância local. Assim sendo, intensifica-se a colaboração entre a administração pública e a sociedade civil, estando a população mais receptiva a participar no desenvolvimento de estratégias de planeamento local.
O nível de participação do público nas várias etapas do processo de planeamento está fortemente relacionado com o grau de desenvolvimento das TIC. Quanto mais evoluída for a tecnologia disponibilizada pelos municípios mais envolvidos podem estar os cidadãos no processo de planeamento, participando, por exemplo, na criação de soluções territoriais e na adopção de instrumentos de planeamento.
O crescimento e a modernização das TIC são a oportunidade para intensificar a participação da população nos processos de planeamento, tornando-os mais democráticos e libertando-os de uma certa carga negativa que lhes está associada, atribuída sobretudo à sua falta de transparência e de representatividade[14]. Assim sendo, parece claro que, ao promover-se a participação da população, o ambiente interactivo proporcionado pelas TIC pode influenciar consideravelmente o desenrolar dos processos de planeamento.
Face às repercussões apresentadas ao nível da divulgação de informação, da visualização, da comunicação e da participação, é lógico concluir que as TIC possuem enormes potencialidades enquanto veículo de comunicação no planeamento do território.
No entanto, autores como Chadwick e May[16] e Torres, Pina e Acerete[17] afirmam que os resultados reais da utilização das TIC ficam, pelo menos até ao momento, muito aquém das suas possibilidades em termos do aumento da quantidade e qualidade da participação no planeamento do território. Este facto, remete para uma questão central de suma importância: a disponibilidade da tecnologia é uma condição necessária para potenciar a participação da população no planeamento, mas não é suficiente, existindo outras variáveis igualmente indispensáveis. Nesse sentido, Evans-Cowley e Hollander[2] e Evans-Cowley e Conroy[18] apontam algumas das principais dificuldades que impedem que as TIC constituam o veículo de comunicação que os planeadores tanto necessitam no planeamento:
• Carências e desigualdades na dotação de infra-estruturas;
• Custo elevado da utilização das TIC;
• Falta de equidade na participação;
• Desconhecimento da representatividade da participação;
• Desmotivação, pela falta de garantia de que os resultados da participação sejam utilizados pelos decisores;
• Complexidade da interpretação da informação digital relativa ao planeamento (mapas, planos, etc.);
• Necessidade de conhecimentos e competências para utilizar as TIC.
Face a estas dificuldades, deve continuar-se a utilizar-se a participação nos moldes tradicionais no processo de planeamento (reuniões presenciais, contactos pessoais, etc.) sendo o recurso às TIC utilizado essencialmente como método complementar. De facto, a participação através das TIC não deve ser encarada como uma substituição e uma exclusão das técnicas e modelos actuais. Pelo contrário, deve ser considerada como um bom suplemento às formas tradicionais e clássicas de participação pública.
Pode pois concluir-se que uma combinação inteligente dos media tradicionais e emergentes, incluindo a Internet, a imprensa e os contactos pessoais interactivos permite maiores garantias de sucesso à participação e aos processos de planeamento.

4. Conclusão: A EmergÊNcia do E-planning Como Desafio às CompetÊNcias Dos Planeadores

Ao longo dos últimos anos, a utilização das TIC tem aumentado permanentemente em quantidade e diversidade nas actividades do planeamento do território[9]. Para além de melhorarem o tratamento e a gestão da informação, as TIC facilitam a comunicação e a participação, reforçando as ligações entre as instituições e os cidadãos, o que se reflecte ao nível do aumento da legitimidade e da qualidade das decisões territoriais. Assim, através do emprego das TIC, as instituições tornam-se mais fortes e mais capazes de responder aos anseios da população.
Na prática diária dos departamentos de planeamento tornaram-se habituais tarefas como a publicação de informação na Internet, a comunicação através de e-mail, os “chattings”, o acesso a dados em tempo real, as simulações de intervenções territoriais, etc. Como corolário deste emprego crescente das TIC no planeamento, quer enquanto instrumento de trabalho, quer enquanto veículo de comunicação, emerge o conceito de e-planning[1][8][9].
Segundo Brkovic[8], o e-planning permite que mais pessoas possam participar na gestão territorial de um modo mais preciso e transparente. Sendo que os processos com informação mais complexa podem ser analisados, documentados, reproduzidos e comparados de forma mais simples e eficaz do que através do planeamento analógico.
Mas, para além destes aspectos positivos, registam-se igualmente alguns problemas relacionados com o e-planning, que, em termos gerais, resultam de um conjunto de dificuldades aqui identificadas e associadas ao uso das TIC quer como instrumento interno de trabalho, quer como veículo de comunicação com o exterior.
Reconhecendo que, na última década, se registaram grandes avanços nos departamentos de planeamento devido à utilização das TIC, Torres, Pina e Acerete[17] salientam contudo que não se cumpriram muitas das expectativas criadas em redor da sua implementação, em particular, no que respeita à maior interação entre os cidadãos e os seus representantes. Para estes autores, na maioria dos casos, o e-planning constitui sobretudo uma extensão da administração pública anteriormente existente, com os benefícios a resultarem da rapidez e da acessibilidade “24/7”. Sintoma claro deste insuficiente desempenho do e-planning, constitui o facto de não se terem reduzido as tensões e os conflitos no planeamento, os quais inclusivamente, nalguns casos, se têm acentuado.
Impõe-se sublinhar que para esta situação muito contribui a carência de técnicos de planeamento qualificados a nível local, capazes de implementar e utilizar adequadamente as TIC nos processos de planeamento e de tomada de decisão[7]. Este facto torna-se mais grave quando o e-planning regista uma permanente evolução que necessita de ser acompanhada pelo desenvolvimento de novas competências dos planeadores.
O e-planning constitui uma realidade que não pode ser ignorada e um “lugar” onde parte do desenvolvimento físico, social e económico se desenvolve, pelo que deve merecer a devida atenção dos decisores. Se no passado o e-planning tinha uma expressão limitada, presentemente faz parte intrínseca da rotina quotidiana do profissional de planeamento.
Sendo um dado adquirido que a complexidade do processo de planeamento continuará a crescer durante este período de expansão das TIC e de desenvolvimento do e-planning, importa compreender que apenas existe uma forma de enfrentar esta complexidade, que é precisamente com o aumento da utilização das TIC. Pode, porém, afirmar-se com alguma certeza que no novo planeamento o grau de exigência relativamente à integração das TIC será progressivamente maior, sendo que, quanto mais evoluída for a utilização das TIC, maiores serão, em princípio, as suas repercussões no planeamento territorial. Assim sendo, recomenda-se a implementação das seguintes medidas:
• Reforçar os conhecimentos que os técnicos de planeamento possuem sobre as TIC, designadamente promovendo acções de formação específicas;
• Desenvolver as infra-estruturas de informação e comunicação considerando-as como parte integrante do planeamento e do conteúdo dos planos;
• Incluir no processo de planeamento o estudo dos impactos espaciais relativos às TIC;
• Equacionar novos métodos de planeamento, bem como novas teorias e modelos de desenvolvimento urbano, associados ao e-planning;
• Actualizar e melhorar as linhas de orientação e a legislação sobre o planeamento atendendo às particularidades do e-planning.
Estas medidas procuram introduzir ideias inovadoras no planeamento do território, visando desta forma responder às novas realidades territoriais provenientes da implementação das TIC. Neste sentido, a questão chave reside em criar no planeamento do território uma cultura organizacional que valorize a integração das TIC, que aposte na interactividade e que viabilize uma mais eficiente tomada de decisão, orientada para beneficiar e responsabilizar os cidadãos.

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